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Da Revolução de Abril à Democracia
Apesar de algumas revistas e jornais desempenha-
rem um importante papel na dinamização e desen-
volvimento da vida literária portuguesa, só em 1980,
nasceu a
Nova Renascença
, importante órgão no que
respeita à ref lexão sobre temas atuais e sobre o sig-
nificado de Portugal no mundo, mas que, de algum
modo, ainda alimentava a missão messiânica pesso-
ana, preconizando uma missão de alta desenvoltura
para o País. Nela colaboraram, entre outros, José Au-
gusto Seabra e Agostinho da Silva.
A divulgação da revista
Colóquio/Letras
, da Fundação
Calouste Gulbenkian, é, também, muito importante.
Também, alargando o imaginário português, urge sa-
lientar, entre outros, Miguel Sousa Tavares, que em
Equador
, num revivalismo de revisita e reescrita do e
ao romance queirosiano, transporta-nos para as pro-
blemáticas subjacentes ao regicídio. Margarida Rebe-
lo Pinto, que, numa escrita «fácil de ler»/
light
, como
muitos dirão, sem artificialismos prosaicos, pinta de
modo «suave» e com cores «suaves» uma aguarela
da sociedade «elite» do Estado Novo/Democracia.
Em
Português Suave
, mais um seu romance classifica-
do por muitos de «banal», «fácil de ler» ou «assim até
eu escrevia», regista e tipifica grupos da sociedade
portuguesa do pós «25 de Abril».
Tal como profetizou Pessoa, Portugal será gran-
de, será um império, ainda que mais não seja, o do
modo de ser português e o da língua portuguesa. Se
Saramago, Lobo Antunes, e Miguel Sousa Tavares,
entre outros, criaram um novo imaginário portu-
guês e alargaram o horizonte para as colónias, é da
África portuguesa e pós-colonial que surgem nomes
renovadores: Pepetela, José Eduardo Agualusa, Lu-
andino Vieira, Ondjaki e Mia Couto. Em poesia ou
em prosa, eles narram os traumas e as catástrofes
oriundas do salazarismo. Em
Terra Sonâmbula
, que
passou ao cinema:
«No Moçambique pós-independência, mergulhado
em uma devastadora guerra civil, em meio a peri-
gos e carências de toda ordem, o menino Muidinga
e seu relutante protetor, o velho e alquebrado Tu-
ahir, caminham a esmo, fugindo do morticínio in-
sano causado pelas guerrilhas que lhes destruiu a
base material da existência e sua teia de relações
familiares e sociais.
Encontrar os verdadeiros pais de Muidinga, que foi
recolhido por Tuahir num campo de refugiados, é a
justificativa da viagem. Mas, na verdade, os dois ape-
nas procuram se manter vivos, tarefa que nem sem-
pre parece possível.» Narram-se as catástrofes her-
dadas pelo salazarismo e a tentativa de se criar uma
cultura autónoma.
Os anos iniciais deste milénio trazem-nos histórias de
vida, pequenas histórias de grandes histórias, biogra-
máscaras das narrativas e dos poemas, conduzindo-
-nos à experiência de sentir pulsar o viver e conviver
com o tempo de ser português.
É ao longo destes anos que se desenvolvem as obras
de Saramago e Lobo Antunes.
Na década de 80, Saramago escreve
Levantado do
Chão
,
Memorial do Convento
,
Jangada de Pedra
e
His-
tória do Cerco de Lisboa
. Lobo Antunes, em 1997,
com
Esplendor de Portugal
, vai tratar a problemática
da descolonização. Esta problemática, muito embo-
ra não em romance, já estava deveras documentada,
entre outros, por António de Spínola, em
Portugal e o
Futuro
e em
País sem Rumo
.
Lobo Antunes em
D’este viver aqui neste papel descrito
– cartas de guerra
, relata, documenta os tempos difí-
ceis que viveu, enquanto médico e militar, em Angola.
Regressado a Portugal, mas intrinsecamente ligado à
apoteose africana, mistura na sua escrita o quotidiano
lisboeta com memórias e escreve
Memória de Elefante
,
a sua primeira obra galardoada.
Os Cus de Judas
, 1979,
retrata a sua experiência pessoal como médico de cam-
panha enviado para Angola, na Guerra Colonial. É o
seu segundo livro e valeu-lhe, em 1987, um prémio da
Embaixada de França em Lisboa. Em
Fado Alexandrino
,
Lobo Antunes relembra o que aconteceu em 1974.
Entre os múltiplos prémios recebidos, destacam-se:
o Grande Prémio de Romance e Novela da Associa-
ção Portuguesa de Escritores, o Prémio Rosalía del
Castro do PEN Club Galego, o Prémio de Literatura
Europeia do Estado Austríaco, o Prémio União Lati-
na de Escritores e o Prémio Jerusalém.
Os anos de 80 e 90 foram inauditos no que concerne à
consagração de escritores portugueses. O maior ga-
lardão, o verdadeiro prémio pelo e do amor à palavra
em língua portuguesa, foi atribuído a José Saramago,
quando foi nomeado, pela Academia Sueca, Prémio
Nobel da Literatura, a 8 de outubro de 1998. Foi a pri-
meira vez que a literatura portuguesa viu consagrado
o nome de um seu escritor. Saramago foi traduzido
nas mais diversas línguas e consequentemente mui-
tos mais escritores portugueses ou que escrevem em
português passaram a «abstrata linha» do horizonte,
«deram novos mundos ao mundo» e «receberam os
beijos merecidos da verdade».
O Prémio Camões, instituído, em 1988, pelos gover-
nos de Portugal e do Brasil, considerado o mais im-
portante prémio literário destinado a galardoar um
autor de língua portuguesa, foi sobretudo atribuído
a escritores portugueses: a Miguel Torga em 1989,
a Vergílio Ferreira em 1992, a, como acima referido,
José Saramago em 1995, a Eduardo Lourenço em
1996, a Sophia de Mello Breyner em 1999, a Eugénio
de Andrade em 2001, a Agustina Bessa Luís em 2004
e a Lobo Antunes em 2007.
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