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Mas as eleições vão propiciar uma dura contenda nas ruas e os con-
frontos comaGuardaMunicipal emLisboa fazemcatorzemortos emais
de cem feridos. A violência policial acirra os ânimos e nem a simpatia
donovomonarca conseguedemover aqueles quemanifestamenteque-
remacabar como regime.OPartido Republicano acaba por eleger sete
deputados,e ocorremvárias tentativas de entendimento e de tréguas
entre monárquicos e republicanos, sendo o próprio rei um dos inte-
ressados num clima de apaziguamento. Exprimindo um sentimento
então generalizado Afonso Costa disse no Parlamento: «Nada vale,
pois,àMonarquia,que o novo rei seja jovem,simpático emesmo belo,
no conceito de algumas senhoras,jovens como ele.Nada lhe vale que
o rei seja objecto de manifestações, tanto mais que, para as receber
como rei, ainda não praticou nenhum acto meritório; antes o seu
curto reinado está jámanchado comerros e crimes como o da amnis-
tia tardia, incompleta e desigual, e o da chacina, hedionda e vilís-
sima, de 5 de Abril.»
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No Congresso do Partido Republicano, realizado emCoimbra,o direc-
tório que advoga uma linha moderada é reeleito em finais de Abril,
enquanto nomês seguinte o respeitado BernardinoMachado defen-
de, no Centro Republicano de Belém, a rápida revogação das leis
repressivas e a restauração das leis liberais de Barjona de Freitas,
Rodrigues Sampaio e Fontes Pereira de Melo, geradoras de empatia
entre monárquicos e republicanos.
Pretendendo-se reforçar o climade convivênciapolíticadecreta-seuma
amnistia para os crimes políticos e de imprensa,mas isso parece já não
chegar – no Parlamento, António José de Almeida responsabiliza a
Monarquia pelo regicídio e prenuncia o fim do regime, justificando
mesmo o recurso à bomba.
Entretanto o jovem rei prepara a sua própria defesa e a sobrevivên-
cia do regime,comaparentes resultados positivos:a partir deMaio as-
siste a manobras de cavalaria e de infantaria, visita unidades mili-
tares recebendo vivas demonstrações de fidelidade de oficiais do
Exército, e ainda a Escola Naval e o Colégio Militar. Em finais do ano
está cerca de ummês no Norte do País, recebendo proclamações de
lealdade por parte dos comerciantes e industriais do Porto. O suces-
so parece garantido: estudantes e lentes de Coimbra vêm a Lisboa
manifestar apoio a D. Manuel, que recebe também em solene
audiência o clero de Lisboa.
Mas afinal as aparências iludem: o Partido Republicano ganha as
eleições para a Câmara Municipal de Lisboa e no fim do ano cai o
governo de «acalmação» de Ferreira do Amaral. O experiente polí-
tico José Luciano, que tinha instado o chefe do governo a reprimir
com energia as manifestações não autorizadas dos republicanos,
escreve ao rei D. Manuel II: «O Partido Republicano avança a pas-
sos rápidos… Se me não engano, a revolução ameaça-nos de
perto».
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Entretanto o momento aproxima-se, e em 1910 o Partido Republi-
cano, já muito infiltrado pela Carbonária (desde Abril do ano ante-
rior esta assumira preponderância no Directório no Congresso de
Setúbal), delibera enviar às «grandes potências» europeias uma
missão diplomática exploratória para sondar as reacções ao golpe
previsto. Em Junho, José Relvas e Magalhães Lima iniciam uma via-
gemde contactos por França e Inglaterra, enquanto em Lisboa, numa
assembleia no Palácio Maçónico, em 14 de Junho, é criada uma
«
Comissão de Resistência», encarregada de preparar a revolução.
Nas eleições de Agosto, os republicanos elegem catorze deputados,
e no mês seguinte D. Manuel lê o último discurso da Coroa, vendo,
ilusoriamente, as tropas no Buçaco, reunidas para comemorar a
vitória anglo-lusa sobre os invasores franceses, prestarem-lhe
homenagem e fidelidade. Depois, foi o 5 de Outubro.
Forças militares e civis, barricadas na Avenida da Liberdade, durante a Revolução republicana de 5 de Outubro de 1910