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dade da Coroa em arcar com o ónus da criação de uma infra-estru-
tura postal pública permanente, permitindo dessa forma o recurso
à iniciativa de particulares para superar as lacunas da sua adminis-
tração. O provimento dos ofícios públicos corresponderia tambémao
reconhecimento régio da dedicação e fidelidade dos seus vassalos
mais prestimosos e serviria como compensação de serviços relevan-
tes prestados à Coroa.
No entanto, há que chamar a atenção para umoutro facto damaior
importância. A criação do ofício de correio-mor não surgia de uma
necessidade premente demelhoramento do serviço de comunicações
da Coroa, conforme se poderia presumir dentre as obrigações de
Luís Homem e que consistia em «ter sempre todos os correios que
foremnecessários para irema quaisquer partes que seja,
assim com
cartas nossas
,
como de quaisquer mercadores e pessoas que lhas qui-
serem dar»
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.
De facto, a Coroa já possuía naquela época um servi-
ço para o transporte das suas correspondências praticado pelos
«
moços de estribeira», cuja responsabilidade estava a cargo de um
alto funcionário da Casa Real, o estribeiro-mor, como já foi dito no
início deste artigo. Nesse tempo, os moços de estribeira supriam
praticamente toda a necessidade de «correios» da coroa, sendo Luís
Homem uma excepção por não ter pertencido ao seu número, ape-
sar de poder ter sido filho e irmão de um estribeiro-mor. Já Luís Afon-
so, seu sucessor no ofício de correio-mor do Reino após o seu fale-
cimento em 1532, foi escolhido dentre os moços de estribeira que
serviam a casa real e cuja função exercia pelo menos desde 1514
83
.
Assim,emprimeiro lugar,mais do que suprir uma necessidade do Esta-
do, a criação do ofício de correio-mor veio preencher uma lacuna na
organização do serviço postal regular para um público mais diversi-
ficado, vindo posteriormente complementar e melhorar as necessi-
dades de comunicação da própria coroa portuguesa.
Com a sucessão de D. João III ao trono português, após a morte do
rei D.Manuel em 1521, Luís Homem foi confirmado no ofício pela carta
régia de 2 de Agosto de 1525
79
.
Nesse novo diploma especificou-se
melhor que:«nenhum correio que de fora vier de qualquer partes que
sejam, não se apeará nem dará nenhumas cartas a nenhuma pes-
soa, sem primeiro ir buscar o dito correio-mor ou a pessoa que por
ele servir e a ela dará as ditas cartas para ela as dar a quem vão, ora
sejam para mim ou para qualquer outra pessoa assim em minha
corte, como na cidade de Lisboa, dos quais correios se foremde den-
tro de Espanha, levará de apresentação de cada um, dois reais de
prata ou três vinténs por eles, e se for de fora de Espanha, lhe paga-
rão um cruzado cada um».
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Numa perspectiva histórica-institucional, em que consistiria então
o ofício de correio-mor? Antes de mais nada, num ofício de nature-
za pública e burocrática. Ou seja, através da criação e provimento dos
mais diversos e variados ofícios públicos por parte dos soberanos por-
tugueses durante o Antigo Regime (entre os séculos XV e XVIII), pro-
curava a Coroa, então em franco processo de centralização política,
delegar poderes e funções em áreas em que o poder real ainda não
poderia se organizar e expandir de maneira satisfatória, por não ter
ainda uma estrutura funcional suficientemente ampla. Surgia, dessa
forma, a génese da moderna burocracia. Os ofícios públicos, então
criados, tinham um carácter de património em que a pessoa que o
servia possuía a sua «função», caracterizada «como um conjunto
de direitos e deveres exercitáveis no interesse público»
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.
A ideia do
monopólio postal namão de umúnico indivíduo, vinha suprir a neces-
sidade embrionária de uma estrutura de correios organizada para
servir o público emgeral e aosmercadores emparticular,abrindo cami-
nho para o seu desenvolvimento. Por outro lado, constituía uma
solução racional por parte do Estado, tendo em vista a impossibili-
Primeiros correios–mores do Reino