Página 6 - Códice nº3, ano 2006

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correios entre 1668 e 1691. Dedicado à intercepção e leitura da cor-
respondência apreendida, este gabinete reforçou a sua actuação
tendo em conta que o superintendente dos correios era, simulta-
neamente, secretário de Estado da Guerra, no tempo de Luís XIV.
Sob a sua vigência todos os estratagemas eramaplicados desde que
ficasse salvaguardado o«serviço do rei»:atrasar a saída dos correios
de modo a impedir que determinadas notícias chegassem a tempo e
com isso fortalecessem adversários políticos; enviar homens a soldo
que assaltassem os correios em trânsito a fim de se apoderarem de
correspondência considerada vital, simulando o roubo das impor-
tâncias em dinheiro que transportasse, entre outros exemplos.
No entanto, quando Louvois confrontado com a suspeição do públi-
co ou de autoridades estrangeiras afirmava sempre, resolutamente,
a sua inocência. Esta personagem confrontou-se, aliás, com a cor-
respondência cifrada tendo sob as suas ordens decifradores que se
serviamde tabelas paraoefeito,dandoordens directas aos intendentes
espalhados pelo território para que as usassem sempre que se justi-
ficasse.Assim,torna-se claroqueo«Cabinet Noir»constituía,nas suas
ramificações provinciais, uma estrutura, até um certo ponto, des-
centralizada,embora as funções que lhe competiamestivessem teo-
ricamente entregues à mais alta hierarquia da rede postal e, ainda
assim, não a toda ela.
Toda esta prática era, aparentemente, contrariada por medidas de
salvaguarda dos correios em trânsito, quer nacionais quer ao serviço
de potências estrangeiras,mesmo emcontexto de guerra.Há notícias
de acordos neste sentido firmados entre o superintendente e o conde
deTaxis
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,
responsável máximo dos correios do Sacro Império.Mas ela
ficou suficientemente documentada na correspondência dos seus
contemporâneos,que ainda hoje se conserva,não escapando sequer
os membros da família real. Tinha, apesar de tudo, como principal
As lutas que opuseram Carlos V a Francisco I, visando a obtenção do
título imperial,marcaramummomento alto desta contradição entre
comunicação e sigilo. Caracterizou-se esta conjuntura, igualmente,
pelo recurso à criptografia como meio de impedir o conhecimento do
conteúdo das mensagens escritas. A linguagem codificada incluindo
o uso de nomes convencionados previamente para a designação dos
personagens citados nas correspondências eram habituais.
Francisco I, em carta de 6 de Outubro de 1546 ordenou, então,que os
solicitadores, agentes ou servidores de príncipes e senhores admi-
tidos na corte de França fossem proibidos de «escrever qualquer
carta ou notícia em código e caracteres ou nomes supostos
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excep-
ção feita aos embaixadores do papa,do imperador,dos reis de Ingla-
terra e de Portugal, entre outros.
Com largo uso nas actividades diplomáticas, emissários especiais e
embaixadores eram portadores de correspondência cifrada, muitas
vezes à margem da rede postal do reino de França, por esta se reve-
lar demasiado exposta à intercepção bem como ao saque, roubo e
mesmoassassinatodos correios tão comuns nesteperíodo conturbado.
O uso de códigos, ainda assim, era complementado commedidas de
alteração ao longo do percurso da missiva ou eram duplicadas as
mensagens e transportadas por emissários diferentes.
É necessário explicitar,no entanto,que,até ao final do século XVI em
França,a redepostal eraapenas de carácter oficial,estando,portanto,
dedicada ao serviço exclusivo do rei e da administração ou de quem
fosse especialmente autorizado.
Será a instituição do serviço postal público que, por força do mono-
pólio dos serviços de correios,marcará a institucionalização do«Cabi-
net Noir».
O surgimento deste serviço,de começos obscuros,adquire uma impor-
tância cada vezmais evidente comLouvois,superintendente-geral dos