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os excedentes deveriam ser reinvestidos e não distribuídos como divi-
dendos. E quanto aos capitais obrigacionistas, consideravam-se
excessivas as taxas pagas, citando-se o exemplo de companhias que
tinham reestruturado os seus empréstimos com taxas mais baixas.
Sugeriu--se também que na praça portuguesa talvez fosse possível
encontrar dinheiro mais barato. Referiu-se ainda que a contribuição
positiva para as contas externas era de curto prazo,pois como decor-
rer dos anos o dinheiro voltaria a sair do País como juros e dividendos
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.
Estava em causa um problema maior. A posição da APT no serviço
telefónico português era privilegiada,semdúvida.Poderia ter sido jus-
tificável em 1882. Mas já não se justificava. Segundo Couto dos San-
tos:«No estado de progresso técnico atingido presentemente pelos
serviços dos CTT, só devemos lastimar-nos de que uma deliberação de
outras eras tivesse dado esta concessão de serviços telefónicos,
criando, desta maneira, uma situação verdadeiramente anómala:
o Estado explora as zonas pobres e difíceis, isto é, aquelas de peque-
na densidade de assinantes; ao passo que a Companhia concessio-
nária estrangeira explora as duas zonas únicas do país onde a den-
sidade de assinantes é elevada e estes garantem tráfego muito
maior».
Couto dos Santos abordava um dos aspectos institucionais mais
importantes do serviço telefónico em Portugal no século XX. Suben-
tendia-se que a APT, concessionária nas duas principais cidades, dis-
tribuía os lucros como dividendos, que deixavamde estar disponíveis
para financiar o desenvolvimento da rede no resto do País. E que
além disso se permitia cobrar preços mais elevados. Defendendo os
interesses daAGCTT,enumaperspectivanacionalistaquepredominava
na retórica da política económica, Couto dos Santos via como solu-
çãomais adequadaa entrada dos CTT no capital daAPT e a integração
das duas empresas no mesmo enquadramento tecnológico e eco-
«
Uma redução,nesta altura,da taxa de dividendo das acções da APT
será interpretada comoumreflexodoagravamentodas condições eco-
nómicas emPortugal,reflexo este que não deixaria de influir na cota-
ção dos Fundos Portugueses naquela Bolsa. A APT está convencida
que este aspecto do problema nunca foi devidamente compreendi-
do, e assim ousa sugerir que se consulte qualquer perito português
bem versado emassuntos financeiros a fim de se determinar de que
lado está a razão»
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.
O papel do capital estrangeiro
nos investimentos e na expansão das redes
telefónicas portuguesas
No quadro das reticências portuguesas sobre o seu custo de capital,
a APT procurou assim defender-se, argumentando que necessitava
de remunerar bemos capitais para assegurar o financiamento de um
plano ambicioso de investimentos anuais, que iriam desenvolver
substancialmente as redes de Lisboa e do Porto, ultrapassar proble-
mas de qualidade de serviço e reduzir as listas de espera,sobre os quais
se acumulavam queixas. Ao mesmo tempo argumentava que fazia
estes investimentos com recurso a capitais externos, isto é, alivian-
do as restrições que a balança de transacções correntes portugue-
sa enfrentava nos seguintes ao fimda guerra.E ainda que,neste caso,
o governo inglês facilitaria a exportação de materiais e de equipa-
mentos para Portugal, por ser umpaís onde se podiamobter dólares
ou moeda equivalente como meio de pagamento.
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Apesar destes argumentos, a posição da APT foi muito criticada pela
AG CTT. O investimento da APT era bom, indiscutivelmente.Teria sido
considerado dosmelhores investimentos ingleses no estrangeiro pelo
Finantial Times
.
Ora,remunerações desse tipo para o capital accionista
tambémpoderiam ser acessíveis a portugueses. Ou, emalternativa,
A previsão do número de chamadas locais e regionais por posto foi um dos principais pontos de divergência entre os CTT e a APT. Um dos problemas dizia respeito aos
efeitos da conjuntura económica no tráfego. Em 1945-46 tinha-se dado uma queda do número de chamadas por posto. A APT pretendia interpretar esta queda como
um sinal de estagnação, ao passo que a AG CTT a entendia como meramente conjuntural. A posição da AG CTT era certamente mais razoável. Dadas as externali-
dades de rede e a natureza da procura do serviço telefónico, o número de chamadas por posto deveria crescer com o número de assinantes e com o crescimento do nível
geral de actividade económica. APT - Revisão de tarifas, 1950, volume 2, acervo iconográfico da FPC.