Página 56 - Códice nº2, ano 2005

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rado,amensagemé,neste caso, de solarização, evocando a lumino-
sa eternidade almejada pelo defunto.
É evidente que a cor do amuleto
uadj
tinha de ser o verde, dado que
o amuleto é um papiro estilizado e que significa precisamente verde
ou,por desenvolvimento conceptual, tornar verde,isto é,enverdecer,
rejuvenescer, ressuscitar.
As cores étnico-políticas assinalam-se canonicamente na pele acas-
tanhada dos egípcios,marcando a diferenciação com outros povos,
sendo bem reconhecidos os pretos da Núbia, os líbios de tez mais
clara e com estojo fálico e trancinhas, os sírios também de tez clara
e barbichas pontiagudas, com garridos trajos, sendo igualmente
claros os hititas e os cretenses
(
Keftiu)
,
ambos com longas cabe-
leiras.
Nem sempre os artistas pintavam os seus temas de acordo com a
coloração real que bem conheciam. Por exemplo, no túmulo de Peto-
síris, do período ptolemaico, a cor da abundante folhagem de algu-
mas cenas da decoração mural não corresponde de facto à realida-
de,pois o que interessa ali é jogar comalegres contrastes cromáticos
para avivar a variegada ambiência vegetal. De resto, o próprio sarcó-
fago de Petosíris é um excelente exemplo do uso de hieróglifos colo-
ridos empastade vidroeoutrasmatérias paradar a cor natural de cada
signo gravado.
Note-se, entretanto, que muitas das superfícies pintadas em diver-
sos materiais da abundante e diversificada produção artística e uti-
litária do país do Nilo viramas suas cores originais alteradas por acção
dapassagemdo tempo,emespecial as obras expostas à forte luz natu-
ral do Egipto, que, ao longo dos séculos, foi decompondo os pigmen-
tos utilizados. Mas, pelo contrário, as cores da natureza e da paisa-
gem continuam como há milhares de anos.
mestria adaptar à configuração do recipiente no acto de fabrico, e a
brecha ou outras rochas mescladas.
Quanto à variada pedraria utilizada nas jóias,os exímios ourives esco-
lhiam e seleccionavam as pedras mais pela cor e o brilho do que pela
sua raridade. Erammuito apreciadas a cornalina,a calcedónia,a tur-
quesa do Sinai, a amazonite azul esverdeada, a ametista da Núbia,
o jaspe vermelho e as suas duas variantes acastanhada e esverdea-
da.Tambéma obsidiana era usada,mesmo para grandes obras escul-
tóricas. Outra pedraria amiúde usada no fabrico de jóias e amuletos
era o cristal de rocha, e, como elementos de substituição da pedra, a
esteatite esmaltada e a faiança (termo que do ponto de vista técni-
co não é mais correcto, mas que se acabou por impor).
Cromatismo profiláctico
É nas jóias e nos amuletos quemelhor se pode apreender o cromatismo
de timbre profiláctico e apotropaico do uso da cor, a qual no antigo
Egipto sempre foi um sensitivo meio de comunicação.
Oamuleto do coração (
ib
)
era,naturalmente,representado emcor ver-
melha, sendo nesta circunstância muito apropriado o uso da corna-
lina.No entanto conhecem-se exemplares emque o amuleto do cora-
ção poderia ter outro cromatismo: é o caso do azul escuro e mesmo
do preto, que se podem observar em corações pintados em sarcófa-
gos de madeira datados da XXI dinastia. Neste caso tratar-se-ia de
uma alusão à vida no Além, onde se julgava que o coração conti-
nuaria a desempenhar preponderante papel no peito do osirificado
que tinha atingido a vida eterna. É que o preto, como já vimos, tinha
conotações fúnebres associadas,não necessariamente ao luto pesa-
roso, mas à tão ansiada ressurreição e, daí, à vida eterna. Por outro
lado, quando o coração é pintado de cor amarela, oumesmo de dou-