O desfecho das escutas telefónicas em Portugal

A ditadura política em Portugal, liderada por António Oliveira Salazar e, mais tarde, por Marcello Caetano, controlava o aparelho político para manter o sistema policial e judicial na dependência da administração estatal.

A censura à expressão livre manifestava-se a todos os níveis da sociedade, pelo controlo total da informação nos vários meios de comunicação social e nas áreas cultural, política e religiosa.

Aquilo que era considerado nocivo ao bom funcionamento da sociedade era proibido e imediatamente suprimido pela Polícia Internacional de Defesa do Estado (PIDE), que se dividia entre os serviços de investigação, responsáveis por interrogar os presos políticos e instruir os seus processos, e os serviços de informação, que geriam os arquivos e ficheiros, a interceção postal, as escutas telefónicas e o trabalho dos informadores.

As escutas telefónicas e a interceção postal eram duas das maiores ferramentas utilizadas, pelo que a colaboração com os serviços dos correios e telecomunicações era fundamental.

As chamadas telefónicas de habitações sob vigilância eram desviadas pela Central Telefónica dos Correios para a sede da PIDE, onde eram escutadas e gravadas. Um número reduzido de funcionários, dependentes dos Serviços de Informação da PIDE, executava a interceção e transcrição das gravações com rapidez, eficiência e discrição, encaminhando a informação para os poderes de decisão.

Elementos de caráter biográfico, político e particular poderiam ser usados como chantagem para assustar o alvo da escuta, facto que era negado pelos Serviços de Informação que defendiam as escutas como meio para assegurar preventivamente atos concretos que pusessem em perigo a estabilidade do regime.

A PIDE obteve “vitórias” importantes em 1964 e 1965 com a prisão de membros do setor intelectual e do movimento estudantil do PCP, alegando atividades contra a segurança do Estado.

Após a substituição de Salazar por Marcello Caetano em 1969, a PIDE foi transformada na Direção-Geral de Segurança (DGS), sob a tutela do Ministério do Interior, com a 1ª Direção de Serviços de Informação (DSI) focada em se tornar uma organização de Intelligence semelhante à CIA.

Durante o período “marcelista”, a agitação política, social e cultural contra o regime ditatorial e a guerra colonial foi crescendo. As sociedades recreativas, cooperativas, universidades, liceus, empresas e sindicatos eram os principais intervenientes. A oposição ao regime aumentou em número e diversificação geracional, profissional e social.

De acordo com a Comissão de Inquérito às Escutas Telefónicas, as ligações foram desfeitas em 26 e 27 de abril de 1974, quando o cabo coaxial entre a PIDE e a sede dos TLP foi cortado.

As escutas telefónicas da PIDE/DGS permanecem até hoje uma realidade pouco aprofundada e num generalizado segredo, sem registos nos processos judiciais por crimes contra a segurança do Estado.

A Comissão de Extinção da PIDE decidiu não analisar detalhadamente as escutas, por considerar uma grave violação de privacidade, e não divulgar informações ao público sobre essa atividade.

A exposição Do Cabo Zero à Liberdade, no Museu das Comunicações, apresenta documentos que explicam os procedimentos e mecanismos de vigilância, além de exibir diversos itens relacionados aos sistemas usados, como telefones e centrais de encaminhamento de chamadas.

Fontes consultadas:
500 Anos do Correio em Portugal, de Fernando Moura
Os Cinco Pilares da Pide, de Irene Flunser Pimentel
Os Últimos do Estado Novo, de José Pedro Castanheira