A melhor carta 2025, de Bernardo Ferreira

Oceano Atlântico
Praia Coração do Mar

À criança que brinca na areia
No coração do mar
1001 Sonhos
Conchas e Sorrisos

Praia do Coração do Mar, 21 de junho de 2025

Querida criança que brinca na areia,
Escrevo-te no primeiro dia de verão, pois sei que, à semelhança de outros anos, vais passar os próximos três meses comigo e quero que o consigas fazer por muitos mais anos, mas, para que isso aconteça, preciso que tu cuides de mim e espalhes a mensagem.

Olho para ti aí a brincares na areia feliz e espero que o consigas fazer durante muitos mais anos. Escreves o teu nome na areia, brincas com os teus amigos, fazes castelos de areia e muitas mais coisas que já te vi fazer. Tu foste a pessoa que escolhi para escrever esta carta, porque vejo que és uma criança muito feliz, que é bem comportada, é amiga e que especialmente ajuda os outros, e agora peço que me ajudes. Esta é a praia que tu e a tua família têm escolhido durante estes anos todos, acredito que quando fores mais velho queiras trazer os teus filhos e os teus netos a visitar-me. Espero que eles sejam iguais a ti.

Este nosso cantinho, tal como tantos outros , está em perigo e vou te explicar porquê. Há muito tempo eu era muito brilhante, puro e intocável, os humanos respeitavam-me sempre, tinham medo de mim e até chegavam a inventar gigantes que moravam aqui. Fui estrada de conquistas, uni povos e acolhi muitas espécies marítimas. Mas os humanos deixaram de me respeitar e hoje estou mais quente, mais cansado e carrego cicatrizes de plástico esquecido e manchas negras que me tiram o fôlego. Tenho redes deitadas que me aprisionam os movimentos e as espécies que vivem em mim estão a diminuir tragicamente,
vítimas de uma mudança que não pediram.

Tu, criança que brinca na areia, tens o poder de mudar isto tudo, tu ainda vês esperança e apanhas conchas com admiração, ainda podes desenhar um futuro diferente para mim e para todos. Quando caminhas pela areia, apenas deixas pegadas e memórias. Quando mergulhas nos meus braços, dou-te um abraço sem perceberes, porque não trazes para cá lixo. Preciso que sejas a voz onde eu não consigo chegar e que mostres como preciso de ser tratado. Diz-lhes para não deixarem no areal garrafas abandonadas; que digam não ao plástico que não se dissolve no tempo, preferindo materiais que a Terra pode acolher sem medo; que usem menos e reutilizem mais; que poupem água; que comam apenas o que foi pescado com respeito; que optem por escolhas que não derramem escuridão no meu azul; que não deixem redes que me transformam num cemitério silencioso; que levem de mim apenas o necessário sem me tirarem tudo, porque eu tenho ainda tanto para vos dar. Se conseguires transmitir tudo isto, será sempre verão no coração de todos nós. Agora, criança que brinca na areia, o futuro vive nas tuas mãos. Enquanto o futuro não chega, deixa-me perder-me neste momento a ouvir as tuas gargalhadas e a acreditar que vamos conseguir. Nunca te esqueças, enquanto cuidares de mim, eu estarei aqui.

Muitas brisas de felicidade,
Oceano Atlântico