Página 61 - Códice nº6, ano 2009

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faltaoacordogovernamental.Porém,nodia seguinte,todas as expec-
tativas fracassam e a UON dá por terminada a greve geral perante a
irredutibilidade do Governo.
Em Caxias é proposta uma saída honrosa aos presos. Porém, e de
comum acordo, só saem depois de assinar uma declaração em como
só retomarão a actividade se os seus colegas presos no resto do País
e,emparticular,abordo do
LourençoMarques,
forem libertados.É com
o coraçãopesado e cheios dedúvidas sobre odesfechoda sua lutaque
abandonam o forte às 21h do dia 12 de Setembro de 1917.
Quanto à terceira descrição que iremos acompanhar é da autoria de
Luís GonzagaMonteiro e tempor título«A derrota dos telégrafo-pos-
tais na greve de 1920».
A greve de 1920 inicia-se a 3 deMarço e tem como principais razões as
questões salariais.Mesmoapós o fimdaGrandeGuerraem1918as suas
sequelas inflacionistas manter-se-ão durante alguns anos e a velha
questãodas subsistências permanece semsolução.Mas paraalémdes-
tas surgem novas reivindicações como a exigência do reconhecimen-
to das associações de classe e a criação de uma junta administrativa
e profissional que,integrando representantes dos funcionários,estu-
dasse melhorias a introduzir e fizesse o acompanhamento das ques-
tões relacionadas com o pessoal, nomeadamente as questões disci-
plinares.
Acompanhando de perto a luta do funcionalismo público que, entre-
tanto,se deu por satisfeito como reconhecimento da necessidade de
pagamento das ajudas de custo ( de vida ) e cessou a greve, os telé-
grafo-postais continuaramsozinhos omovimento grevista porque,na
verdade, a especificidade das suas carreiras quer quanto ao ingres-
so, quer quanto à evolução, não permitia total equiparação.
No entanto, a intransigência e incapacidade de diálogo com os telé-
grafo-postais continuam a marcar a acção governativa, tal como em
1917,
e a greve irá prolongar-se por todo o mês de Março.
Mas no seio dos funcionários tambémexistiamdiferenças de opinião
que, desde a preparação da greve, inquinavam a sua unidade. Ao
impor-se como reivindicação umaumento igual (de 70$00) para todos
os empregados estabelecia-seumsistemade injustiça relativapois não
eram comparáveis os custos de vida de Lisboa e Porto com o resto do
País.Também as divisões entre «pessoal maior» e «pessoal menor»
se acentuavam quer quanto aos próprios objectivos quer quanto à
acção.
Após o fim da greve do funcionalismo a 13 de Março a pressão gover-
namental recrudesce. A 19 deMarço é publicado umdecreto que con-
sidera todos os funcionários dos correios e telégrafos emgreveemaban-
donode lugar e dissolve todas as associações da classe,abrindoapos-
sibilidade de reintegração a quem se quisesse inscrever nas famige-
radas « listas».
Exaltados com a negação do seu direito à associação previsto na
Constituição da República os grevistas reúnem-se no Jardim Botâni-
co em 26 deMarço onde são cercados pela GNR.Mais de 500 são pre-
sos nessaocasiãomas oGovernodeAntónioMariaBaptista recua,pro-
vavelmente tendo em conta os erros cometidos em 1917 e as suas
funestas consequências, e acaba por libertá-los imediatamente.
A desmoralização entre os grevistas acentua-se,porém,e o comité de
greve acaba por emitir uma nota quemarca o seu fim,perante a estu-
pefacção e revoltademuitos trabalhadores.Nodia 30deMarçoos car-
teiros regressam ao serviço sem que nenhuma das reivindicações da
classe fosse atendida.
Comestes exemplos claros ficamais uma vez demonstrada a falência
da I República face às aspirações das classes laboriosas. Àsmodestas
reivindicações, muito centradas no candente problema das subsis-
tências, só é capaz de responder com a repressão, alienando assim o
apoio de cada vez maiores faixas da população portuguesa com o
desfecho que conhecemos.
GONÇALVES, Bento,
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