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Cores para a eternidade
A cor é um elemento imprescindível da arte egípcia, é o remate natu-
ral de uma obra escultórica ou arquitectónica. O problema é que hoje
muitas das superfícies pintadas desapareceram
irremediavelmente; paredes de antigos túmulos
cujos relevos hoje estão descolori-
dos mas que eram pintados, amplos
muros e tectos de templos já sem
apinturaque inicialmente tinham
(
atémesmo nas paredes exter-
nas), estátuas sema sua colo-
ração primeira, estelas, ele-
mentos arquitectónicos,
tudo perdeu a cor original.
Na estatuária a cor mantém-se
aindaemmuitas figuras de calcário,
mas mesmo as estátuas de granito,
basalto,diorite,xisto,entre outrosmate-
riais de grande dureza, eram geralmente
pintadas como natural remate do trabalho escul-
tórico. Hoje, elas exibem--se em muitos museus
semo seu revestimento cromático original,geran-
do falsas interpretações aos inúmeros visitantes
que a eles acorrem. Até mesmo em Portugal o
fenómeno se pode detectar, sobretudo nas
colecções egípcias que seexpõemaopúbliconoMuseuCalous-
te Gulbenkian,MuseuNacional de Arqueologia eMuseu da Farmácia.
O uso das cores tinha no antigo Egipto regras bemestabelecidas, e a
sua correcta utilização impunha-se aindamais pela conotaçãomági-
ca e sagrada da paleta cromática. Uma das situações mais típicas
derivados do carbonato de cálcio e do gesso, e, enfim, os pigmentos
pretos a partir da combustão de vários produtos.
Sabe-se que oovo tinhagrande utilidade napreparaçãode tintas para
decoraçãode superfíciesmurais,eopróprioovo,especialmenteos gran-
des exemplares de avestruz,obtidos no Sul,
era muito apreciado como superfície que
podia ser pintadaeque tinhaumgran-
de efeito decorativo. Era esta a
única utilidade que o ovo tinha
no antigo Egipto (para alémde
esporádico uso na preparação
de receitasmédicas),jáque ele,
estranhamente,não faziaparte
da alimentação e, na verdade,
não constava das longas listas
de vitualhas gravadas nos túmu-
los, onde os exigentes defuntos soli-
citavam alimento para as suas refeições
eternas.
Podendo ser realizadadirectamente sobre o baixo-
relevo mural, como sucedeu em grande medida
durante o Império Antigo (c. 2660-2180 a. C.), a pin-
tura eramuitas vezes executada sobre estuque fres-
co, recriando cenas da vida quotidiana dos antigos
Egípcios,comobanquetes,danças,recepções,cenas
depescaede caça,comespecial vocaçãopara fixar as variadas acti-
vidades agrícolas,alémde reproduzir as cenas relacionadas comamito-
logia. A pintura mural conheceu o seu apogeu durante o reinado de
Tutmés IV (XVIII dinastia) com exemplos sintomáticos em alguns
túmulos tebanos.
Joalharia de Tutankhamon: o falcão do deus Hórus, com a sua rica plumagem feita de turquesa, cornalina e pasta de vidro azul embutidos em ouro.
Cromatismo divino no túmulo da rainha Nefertari, em Tebas Ocidental: Osíris de pele verde como deus da eternidade e Atum de pele humanizada como criador do mundo.