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M. Le Lannou
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Roma impôs ao Mediterrâneo Antigo e zonas limítro-
fes, como a Península Ibérica e o Próximo Oriente, uma «geografia
voluntária»de carácter político-militar baseada nas vias romanas,em
que os itinerários se impunhamà diversidade geográfica das regiões
que atravessavam: a Natureza era subjugada à «vontade adminis-
trativa» dos romanos.
As razões de base são estratégicas: tratava-se de abastecer os exér-
citos situados nas fronteiras (
limes
),
nomais curto espaço de tempo;
tratava-se, igualmente, de deslocar os próprios exércitos em cam-
panha; tratava-se, finalmente,demanter uma administração coesa
e centralizada.
A sua concepção privilegiava a linha recta, cortando montanhas,
atravessando rios, comviadutos e pontes de sólidos blocos de pedra,
tão perfeitamente concebidas que passados cerca de dois milénios
continuam como marcos na paisagem.
A própria via era pensada para deixar escoar as águas pluviais ou a
neve derretida,pois era convexa,e a sua largura era,por norma,sufi-
ciente para deixar circular dois carros a par. Eram depositadas várias
camadas de enchimento num corte no terreno,
a fossa
,
sendo a últi-
ma (
dorsum
)
depedraaparelhadaouafeiçoadadaqualidademais resis-
tente disponível na região. Nesta camada era dedicado um cuidado
especial às juntas dos blocos de pedra de modo a evitar que fossem
quebrados pelapassagemdos carros ouqueopavimento sofresse infil-
trações das águas da chuva. Tinham, ainda, lancis laterais também
em pedra.
Erampontuadas pormarcosmiliários que indicavamadistânciada cida-
de de onde tinha partido a estrada,assimcomo a distância que sepa-
rava o ponto onde se encontrava da cidade mais importante que se
lhe seguisse. Continham, ainda, a indicação do cônsul ou imperador
que tinhammandado construir ou reparar a via.
Os caminhos de Roma:
cartas e viajantes no Império
Romano
Isabel Varão
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Licenciado em História pela U.L. - Quadro Superior da FPC
R
omaesteveno centrodoMundoentreo séc.I aC.eo séc.Vdanossa
era.Éum lugar comumafirmar queumdos pilares daCivilizaçãoOci-
dental foi formado pelo conjunto de instituições, valores e tecnolo-
gias que foram sendo criados e aperfeiçoados pelos povos do Lácio e,
mais tarde,pela extraordinária construção que foi o Império Romano.
Mais que fazer uma asserção por todos conhecida e reconhecida inte-
ressa-nos desenvolver o tema relativamente a um dos mais relevan-
tes aspectos que lhe está subjacente: a necessidade de deslocações
de pessoas e bens no vasto círculo territorial que ia da Península Ibé-
rica ao Próximo Oriente, passando pelo Norte de África, e a trans-
missão de mensagens que lhe estava associada, o modo como esta
tinha lugar, de que tipo eram as mensagens , sobre que suportes
eram transmitidas e quais as necessidades que visavam suprir.
Mesmo tendo emconta a«décalage» temporal e asmuitíssimo dife-
rentes condições socio-políticas, encontraremos no sistema então
organizado uma relativa facilidade e segurança nas deslocações,
objectivo que só a UE,nos anos mais recentes, conseguiu atingir par-
cialmente no contexto europeu, e de que os correios, pela sua uni-
versalidade, são os mais directos herdeiros.
As vias
Umdos suportes da comunicaçãomais duradouroque os Romanos nos
legaramfoi,precisamente,a rede viária que cobriu todo o Império.Tra-
tou-se de um dado novo para as populações de então, que foi cres-
cendo, paulatinamente, ao sabor das conquistas, da expansão.
Estas vias, produto dos esforços conjugados do exército romano e
das populações locais, cooptadas para a sua construção, faz alterar
grandemente a mundivivência quer dos próprios romanos quer das
populações romanizadas:até então é inegável aprimaziadomar e das
comunicações por barco,mas,seguindode pertoaanálise dogeógrafo
Troço de via romana em bom estado de conservação, Alqueidão da Serra.